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O Ary Magalhães que eu não conhecia

Empresário e ex-deputado Ary Magalhães/Imagem: Câmara dos Deputados.

Só vim a conhecer pessoalmente o empresário Ary Magalhães há uns 15 anos.

As primeiras referências que tive dele, no início de minha profissão, eram aquelas de conhecimento público: um próspero empresário, dono da Vemosa – concessionária da Volkswagen no Piauí e, mais tarde, da Comvap (Companhia do Vale do Parnaíba), sediada no município de União, com seus imensos canaviais.

Em resumo, a visão que eu tinha dele era a de um homem de negócios, com fama de ganhador de dinheiro e rude.

Era também secretário de Fazenda do governador Lucídio Portella (1979-1983) e um dos pré-candidatos à sua sucessão, em 1982, juntamente com o reitor da UFPI, Camilo Filho, e o deputado federal Hugo Napoleão.

O governador e o seu partido optaram pelo nome de Hugo e o resto da história é conhecida de todos.

Ah! Lembro também que, quando comecei a trabalhar na Rádio Difusora, em 1981, ele era o novo dono da emissora, em sociedade com o empresário Abraão Gomes. Eles haviam comprado a rádio da cadeia dos Diários Associados.

Nas nunca o vi por lá. Seu representante na rádio era o executivo Vinícius Machado.

Soube depois que ele era sócio também da TV Pioneira (hoje TV Cidade Verde), nos anos iniciais da empresa.

A trajetória

Não lembro de ter feito entrevista com ele, mas acompanhei, como repórter, a sua trajetória empresarial e o seu ingresso na política.

Em 1994, foi candidato a deputado federal, pelo partido comandado pelo ex-governador Lucídio Portella.

Nas eleições de 1998, apresentou-se como candidato a senador. Na última hora, porém, seu partido lhe deu uma rasteira.

Por debaixo dos panos, o PPB fez um acordo com o senador Hugo Napoleão, que disputava o governo pelo PFL, para lançar o ex-presidente da APPM, Júlio César, como candidato ao Senado.

A manobra política do PPB com o PFL foi um desastre para os dois partidos: o governador Mão Santa (PMDB) foi reeleito e, com o racha no palanque da oposição, o deputado federal Alberto Silva acabou abocanhando a cadeira de senador.

Ary Magalhães foi candidato ao Senado outra vez em 2006, agora no palanque do senador Mão Santa, que concorria ao Governo do Piauí contra o governador Wellington Dias, candidato à reeleição.

Derrotado outra vez, Ary se recolheu à vida privada e voltou a ganhar dinheiro. Soube que há pouco tempo ele vendeu uma fazenda no Maranhão com 4 mil cabeças de gado.

Bagagem cultural

Mas eu dizia que só vim a conhecer pessoalmente Seu Ary há uns 15 anos. Por essa época, ele morava no Luxor Hotel. Eu estava por lá num começo de noite e fui apresentado a ele pelo jornalista e empresário Helder Eugênio, do portal 180graus.com.

Na conversa, regada a vinho, me surpreendi com Seu Ary, homem de muitas leituras.

Ele passou em revista quase todo o cânone literário brasileiro, discutindo obras e algumas passagens delas. Também citou vários autores estrangeiros, principalmente os clássicos.

No final, ainda me indicou algumas leituras. Lembro bem de “Retirada da Laguna – episódio sobre a Guerra do Paraguai”, do Visconde de Taunay, um livro chocante.

Espantando, perguntei: “Como o senhor conseguiu ler tanto?”

Aí ele me explicou que quando foi aprovado para o concurso de fiscal da Receita Federal passou uma boa temporada no Mato Grosso. Como havia pouco a fazer lá, ele ocupava seu tempo lendo. E daí não lagou mais os livros.

Como fiscal da Receita Federal, ele trabalhou ainda em Goiás, São Paulo e no Piauí

Antes de ser aprovado no concurso da Receita, ele foi escriturário do Banco do Brasil, trabalhando em Floriano, Picos e Teresina; auxiliar censitário do IBGE, em Teresina; e fiscal do IAPI (Previdência), em Fortaleza.

O livro que não foi escrito

Seu Ary morreu na manhã de hoje (15), aos 92 anos, em decorrência de complicações renais causadas pela covid-19. Ele estava internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, desde o dia 2 de maio.

Depois aquele nosso encontro no Luxor, ele cogitou escrevermos a sua biografia, mas o plano não foi adiante.

Perdemos, assim, uma oportunidade de saber mais do mundo dos negócios e da vida política recente do Piauí pela voz firme, franca e independente de um de seus protagonistas, que se fez pelos seus próprios méritos e métodos.

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