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Manoel Emílio, o Andante

Para a maioria, era Dr. Manoel; para uns, como o prefeito Firmino Filho, era Seu Manoel; e muitos de nós o chamávamos simplesmente de Manoel e até de “Búfalo Bill”.

Embora os nomes variassem, ele era sempre o mesmo: inteligente, irreverente e desprendido.

De tudo, um pouco: advogado, delegado de polícia, radialista, professor universitário, planejador, artesão e um monte de outras coisas de maior e menor importância.

Assim foi Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira, de quem sua família e seus amigos se despediram hoje.

Ele faleceu na manhã de ontem (27/07), em casa, em Teresina, aos 89 anos, de sequelas da chikungunya, após três meses acamado.

Uma lenda

Manoel Emílio já era uma lenda quando me aproximei dele, no começo de 1993. Entrávamos para a equipe do prefeito Wall Ferraz, ele como assessor especial e eu como secretário de Comunicação.

Mais tarde, na gestão do prefeito Francisco Gerardo, passou a titular da Secretaria Municipal de Indústria e Comércio, com o deslocamento do economista George Mendes para a Secretaria Municipal de Planejamento.

O que eu sabia, até então, do Dr. Manoel Emílio? Que havia fundado os primeiros sindicatos rurais do Piauí, junto com Dom Avelar Brandão Vilela.

E também que tinha sido um dos primeiros presos pelo regime de 1964 no Piauí. 

A prisão em 64

Quando os militares tomaram o poder, ele apresentava na Rádio Pioneira de Teresina o programa “Desperta camponês”.

Um dia do começo de abril, quem foi despertado em casa bem cedo foi ele. Um carro do Exército bateu à sua porta cheio de militares e com uma ordem de prisão. Passou vários dias detido no quartel do 25º BEC e só foi solto depois de muitas negociações dos civis com os militares de plantão.

Planejamento

Eu sabia ainda que, também nos anos 1960, trabalhara na Codese (Companhia de Desenvolvimento do Piauí), na equipe chefiada pelo professor Raimundo Nonato Monteiro de Santana.

De lá, saiu para ser secretário de Planejamento, no período de 16 de setembro de 1968 a 15 de março de 1971, nos governos de Helvídio Nunes e João Clímaco d’Almeida.

Depois, trabalhou na reforma agrária, coordenando a implantação de projetos de colônias agrícolas no Piauí e no Maranhão, onde escapou milagrosamente de ser assassinado.

Por uns tempos, fora ainda superintendente da extinta Funabem no Piauí, no começo da Nova República.

Zé Cândido e dona Antonieta

Na prefeitura, além do professor Ubiraci Carvalho, só ele tratava o prefeito como Wall. Todos os demais chamávamos o prefeito de professor.

Manoel Emílio era primo de Wall Ferraz, um ano mais novo do que ele e fora seu chefe na Codese, embrião da Secretaria Estadual de Planejamento.

Conversa sempre animada e rica de informações. Elas vagavam pelos mais diversificados temas – política, administração pública, viagens, literatura, etc.

Dominava qualquer assunto e herdara do pai, o poeta Oliveira Neto – hoje meio esquecido, como tantos outros – o gosto pela poesia e a prosa.

Nas conversas sobre a política de seu tempo, sempre citava a sua tia Antonieta.

Ela, hoje também esquecida, foi uma figura central da política piauiense dos anos 50 e 60 (os pesquisadores ainda não descobriram isso). Era irmã do senador José Cândido Ferraz e operadora de sua política no Estado.

D. Quixote

O Manoel Emílio que conhecemos era uma espécie de D. Quixote dos Trópicos – sonhador, andante, brigão e, como o definiu o jornalista Cláudio Barros, um rabugento adorável.

Na década de 1980, comprou um caminhão, encheu a carroceria de produtos artesanais, pôs na boleia sua esposa, dona Magda, e se mandou para o Rio de Janeiro.

Parava nas principais cidades para vender suas peças. Em várias delas, enfrentou problemas com a fiscalização, pois não tinha licença para o negócio.

No começo dos anos 1990, ele comprou um Lada – o fusca russo, só que mais duro que um jipe – saiu de Teresina e foi bater no Chile, com dona Magda. Por lá o carro congelou.

Antes disso, visitou o Lago de Ypacaraí, atraído pela bela guarânia de Cláudio Fontana gravada por Julio Iglesias.

Voltou soltando os cachorros contra os dois artistas e contra todos, pois achou que o lago azul da canção era um e o real era outro, uma porcaria.

Produção rural

No começo dos anos 1980, o secretário de Planejamento, Hélio Matos, andava entusiasmado com a ideia de promover um programa de desenvolvimento rural no Piauí.

E, para estimular os produtores, imaginou a promoção de eventos locais conforme a vocação de cada lugar.

Para a região de Altos, por exemplo, caía bem o Festival da Manga. Para a de Barras, o Miss Melancia.  E por aí vai.

Quando a ideia chegou aos ouvidos de Manoel Emílio, este jogou sua pá de cal nela:

– O secretário de Planejamento tá querendo é tomar o lugar da Elvira Raulino?

– Como assim?

– Isso não é programa de governo. É um programa para a crônica social.

Este era o Manoel Emílio em tempo integral. Que seu espírito andante prossiga em paz a sua caminhada, agora em novo plano, e que tenha o descanso dos justos ao final dela.

E que o Senhor da Vida dê conforto à esposa, aos filhos, aos netos e a toda a família!

Manoel Emílio no escritório de casa
Com seu fusca e seu cachorro.
Na caricatura de Izânio
Na sala de estar de sua casa.

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